A PRIVATIZAÇÃO DE TERRITÓRIOS tradicionais de comunidades pesqueiras impulsionada pela especulação imobiliária é a maior ameaça aos direitos dos pescadores no Brasil, revela um relatório do P (Conselho Pastoral dos Pescadores e Pescadoras).
Lançada nesta terça-feira (1º), a terceira edição do “Relatório de conflitos socioambientais e violações de direitos humanos em comunidades tradicionais pesqueiras no Brasil” reúne denúncias de 450 comunidades tradicionais de pescadores, de 16 estados, que enfrentaram conflitos e violações de direitos entre 2022 e 2024. O P é uma das pastorais ligadas à CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil).
De acordo com os dados levantados, 32 mil famílias sofreram violações graves a seus direitos no período mencionado, incluindo cerca de 43 mil mulheres e 29 mil crianças.
Mais da metade dos conflitos, 53,1%, está relacionada à especulação imobiliária, assim como à privatização de áreas e territórios de comunidades pesqueiras (51%). Já empreendimentos turísticos estão ligados a 46,9% dos casos. Os números se sobrepõem porque o questionário respondido pelos pescadores permitia múltipla escolha.
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Uma reportagem publicada no ano ado pela Repórter Brasil mostrou que uma comunidade de pescadores no Rio Grande do Norte, cercada por eólicas em terra, teme que a instalação de turbinas no mar comprometa seu modo de vida tradicional em razão dos impactos na vida marinha e das restrições das áreas de pesca. De acordo com o relatório do P, 10,2% das respostas citam a energia eólica como vinculada a conflitos.
Ainda segundo o documento, empresas privadas, (77,6%), agentes privados (55,1%), Executivos municipais (55,1%) e estaduais (53,1%), latifundiários (38,8%) e empresas públicas (22,4%) são apontados como os principais agentes causadores dos conflitos que afetam a pesca artesanal no Brasil.
Outro fator considerado importante para a intensificação dos problemas (citado em 71,4% das respostas) é a falta de garantia, pelo Estado, de direitos econômicos, sociais, culturais e ambientais das comunidades pesqueiras.
Os impactos da emergência climática
Para 97,3% dos pescadores ouvidos pelo relatório, a emergência climática já impacta diretamente seus territórios. Aumento da temperatura (72,9%) e alterações nas marés (58,3%) e nos ventos (54,2%) são os principais efeitos relatados.
Entre os impactos ambientais, os mais citados foram a diminuição da quantidade de pescado (77,6%), a redução da diversidade de espécies (69,4%) e o desmatamento e destruição de habitats (75,5%). Já a quebra dos laços comunitários (79,6%) e a descaracterização da cultura tradicional pesqueira (71,4%) são os impactos socioeconômicos mais citados.
“A realidade das comunidades tradicionais pesqueiras é historicamente marcada pela ofensiva do capital sobre seus territórios. Esta ofensiva é agravada pelo recrudescimento da violência e pela ausência e/ou omissão do Estado. A soma destes elementos resulta na desterritorialização de comunidades, na destruição do meio ambiente e dos meios de vida, na criminalização de movimentos e pessoas, nas ameaças, em perseguições e mortes, resultando em inúmeras e variadas violências e violações de direitos”, escrevem os autores do relatório, na sua apresentação.